É só quarta-feira e eu já acordei naquelas vibes: NÃO RECOMENDO. Decisão acertada: buscar “tropicália” no spotify e tocar a primeira playlist. Enquanto ouço, frito dois ovos que eu boto pra “escorrer” no papel toalha, porque acho um crime qualquer outra forma de preparo de ovo que não leve óleo ou manteiga, mas estou me reeducando alimentarmente e emocionalmente, daí, para os ovos, papel toalha — para o emocional?, depois eu conto.
Enquanto os ovos “escorrem” e a torradeira esquenta o pão, Gil canta Procissão. A torradeira está para o pão, assim como Gil para o meu espírito. Acho que acordei de novo — dessa vez, recomendo.
Eu estava numa dieta tão mais saudável. Todo um ritual de café da manhã. Três ovos fritos (e escorridos!), pão integral torradinho, abacate pra hidratar a secura do pão, salada verde do que tivesse na geladeira (incluindo um naco de pimentão e uma cenoura crua que eu comia inteira dizendo “quê que há velhinho?”). Tudo feito e degustado com tanta satisfação! Pra arrematar, um capuccino caseiro que deve ter mais calorias que uma lasanha quatro queijos! Mas deuzabençôe, porque faz a alma voltar pro corpo mais ligeiro que a manada debandando lá onde morreu Mufasa.
No almoço? Nada! (O banquete do café termina quase meio-dia!) Na janta? Salada. Mas é que eu juro que GOSTO DE SALADA! Leva queijo, a minha salada. Leva frango ou outra carninha. E aí eu vou dormir levinha, sabe? Penso que meu corpo tá acompanhando o movimento da minha mente. Mens sana in corpore sano e etcétera, né? Coisas que eu achei que eram fake news, mas é doideira, menina. Faz aí só.
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Hoje é só quarta-feira e essa semana já me trouxe umas perturbações que descacetaram minha rotina matinal. Daí o efeito cascata foi inevitável. Deu fome no almoço — e já que almocei, por que não jantar uma pratada de macarrão desintegral? Tá tudo bem quem gosta de todas as refeições, eu também gosto, às vezes. Mas voltar pra esse ritmo de comilança me fez perder a leveza. Mens descacetada in corpore igualmente destrambelhado. Mas vamo lá. Foco na Tropicália e volta pra dieta que assim noiz num erra.
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Agora tá tocando Maria, Maria. Não sei se Milton Nascimento configura Tropicália, mas quem se importa? Discuti com um amigo outro dia que a voz de deus é a de Bethânia e isso prova, inclusive, que deus é mulher. Ele contra-argumentou dizendo que a voz de deus é do Bituca, e isso prova, inclusive, que meu amigo é machista.
Mas o Milton disse e eu não ousaria discordar: quem traz na pele essa marca possui a estranha mania de ter fé na vida. Maria é o nome da minha mãe e eu acabo de me atentar pro fato de que tem uma Maria escondida no meu nome — como eu não percebi isso antes? E eu tenho mesmo essa mania de ter fé na vida — ainda que de maneira igualmente escondida. A Maria, minha mãe foi a Maria da música por muitos anos, mas agora ela acumula muitas marcas, sabe Bituca? — e, por elas, vejo minha mãe se esvaziando de fé. É triste, mas quem pode culpá-la?
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Domingo fomos ver Divertidamente 2, eu e meus filhos, dois adolescentes. O tempo todo eles se enxergando na protagonista — e aí vocês já me devem algum crédito, viu! Porque o filme é sobre uma menina e meus meninos não tem essa coisa de não se identificar com uma história cujo personagem principal é feminino. (Parece pouco? Pois dê uma reparada nos homens com quem tu convive. Repara nos filmes que eles assistem, e nos livros que eles leem. A maioria só consome coisa de homem — um “corporativismo de gênero” que só agora as mulheres estão aprendendo a usar como estratégia de contra-cultura).
Mas o Divertidamente 2 é sobre a adolescência. E foi ótimo assistir com representantes da categoria! Os dois se contorcendo na poltrona e eu rindo e apontando pra eles! O mais velho, mais crítico, disse que é a mesma estrutura do primeiro filme e que não achou nada demais no segundo — típico! Não satisfeito, foi além: me cobrou pela incoerência de ter achado o primeiro filme chatinho e amado a sequência. (É claro que não me lembro direito do primeiro filme, vou ter que assistir de novo pra ser coerente com a minha incoerência com mais propriedade.)
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É a vez da Gal na playlist e eu, de novo, me arrependo de não ter ido vê-la cantar na praia DE GRAÇA, num de seus últimos shows. Você. Precisa saber da piscina, da margarina, da Carolina, da gasolina. Você vai ser pra sempre o Doce Bárbaro que me escapou.
Mês que vem tem Caetano e a deusa-mulher-de-cabelos-prateados. Penso que precisamos nos organizar — eu e o meu squad — nos próximos dias. Ver como ir, como voltar, horário, figurino. Ver o que fazer com a ausência do Luís — certamente a levaremos conosco, revezando de colo, como a gente faz com o neném do grupo, sobrinho de todos, afilhado do Luís.
De vez em quando eu penso “vou ver com Luís se a gente divide um uber”. De vez em quando eu penso “e se alguém passar mal durante o show?” (é que minha tchurma já não tem 18 anos, todo mundo meio bichado, e o show já seria emocionante pra nós, imagina sem o nosso capitão). Mas aí eu penso “o Luís estando lá eu fico mais tranquila”. Tá entendendo? Eu tô contando com o Luís pra ajudar a dar conta da ausência do Luís!
Acho que os caminhos mais usados no nosso cérebro não desaparecem nunca. Cada sinapse é um ponto de luz e os pensamentos são mariposas atraídas pela explosão luminosa desses caminhos.
Precisa tempo pra gente dispersar essas mariposas, parar de pensar do jeito antigo, desbravar novos caminhos e iluminar outros neurônios — inclusive é essa a minha estratégia de “reeducação emocional” que mencionei lá no início.
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Fiz a playlist voltar pro Maria, Maria porque acho que me perdi nos meus pensamentos e não aproveitei a música direito. (Vocês também fazem isso?)
Agora sim. Olha aí como o Milton tem razão.
Precisa força. Precisa graça. Precisa uma dose mais forte e lenta. Precisa rir quando deve chorar. Precisa tudo isso. Temos tudo isso. Somos Maria, Maria.
Pulei a Gal e chegou a vez do Caetano! Alegria, Alegria! Há de ser um sinal.
Bóra quartar, galera?
“Eu vou.
Por que não?”
Aê aêa ê aê aê aêêê… amei!